POESIA SEM FIM | 16 MAIO | 21H30 | IPDJ


POESIA SEM FIM
Alejandro Jodorowsky
Chile/ França, 2016, 130’, M/16


FICHA TÉCNICA
Título Original: Poesía sin fin
Realização e Argumento: Alejandro Jodorowsky
Montagem: Maryline Monthieux
Fotografia: Christopher Doyle
Música: Adan Jodorowsky
Com: Adan Jodorowsky, Brontis Jodorowsky, Leandro Taub, Pamela Flores, Alejandro Jodorowsky, Jeremias Herskovits
Origem: Chile/França
Ano: 2016
Duração: 130’

TRAILER





CRÍTICAS
Um filme que é um poético autorretrato de Alejandro Jodorowsky, uma das mais fascinantes figuras da cultura latino-americana.
Em 1953, Alejandro Jodorowsky decidiu partir do seu Chile natal para Paris. Tinha 24 anos e o objetivo de conhecer e conviver com André Breton, Marcel Marceau e outras grandes figuras da cultura europeia. E já antes, contra mil vontades, havia decidido ser poeta, não como quem escolhe uma ocupação ou um ofício, mas como quem opta por um estilo de vida, da mesma forma que faz um padre ou um ermida. Entregou-se à poesia de corpo e alma, provavelmente sacrificando o primeiro em prol da segunda, contrariando a vontade dos pais e desafiando a sociedade em que se inseria, numa crença intrínseca no belo e no etéreo.
Tudo isto encontramos em Poesia Sem Fim, a segunda parte da autobiografia surrealista e ficcionada do grande poeta, desenhador e realizador chileno Alejandro Jodorowsky, a sequência de La Danza de la Realidad, de 2013, e que retratava apenas a infância. Apesar dos filmes poderem ser vistos autonomamente sem grande prejuízo, o segundo começa onde o primeiro acaba. Juntos fazem um maravilhoso díptico biográfico da juventude do realizador, eloquentes obras de cinema poético, de um surrealismo fora de moda, mais próximo de Fellini do que de Buñuel, com um elevado grau de beleza e pureza.
Poesia Sem Fim é um libertador hino à imaginação e ao encanto das palavras, resposta radical ao materialismo comum às nossas sociedades, declarando que não há valor mais alto do que o impalpável. Todo o percurso do jovem Alejandro não é contado de forma realista, mas através de um colorido painel de alegorias, em que as palavras ganham uma proporção avassaladora, em detrimento das ações. Ou melhor, tudo é poesia. E a vida é desfrutada de forma ainda mais poética do que as palavras escritas: como a decisão de, por os poetas terem um estatuto semidivino, atravessarem a cidade em linha reta, sem se desviarem de qualquer obstáculo.
A juventude de Alejandro Jodorowsky assemelha-se, assim, a um sentido espetáculo de circo, uma dança com a vida e com a morte, um inconformismo estético, uma recusa do real em nome de uma realidade paralela feita da matéria dos sonhos.
Jodorowsky dedica Poesia Sem Fim ao seu amigo Michel Seydoux, que apoiou financeiramente o seu filme anterior, La Danza de la Realidad. Agora, Poesia Sem Fim foi financiado através de uma eficaz campanha de crowdfunding.
Manuel Halpern, visao



Apresentado em estreia mundial na Quinzena dos Realizadores, em Cannes, Poesia sem Fim, de Alejandro Jodorowski chega finalmente ao nosso país. De mansinho, sem em grandes alaridos, pela mão da Films4You, depois de um intenso período de digressão em diversos festivais pelo mundo inteiro. Uma receção demasiado discreta que não rima com o peso e extensão que a obra do chileno Jodorowski tem no universo das artes e do cinema. Mas isso são contas de outro rosário… Aquele a que estamos votados e onde os parques de salas de cinema são praticamente todos ocupados pelas franchises da ordem, afinal de contas, parte da sua luta como cineasta e artista.
Seja como for, completa-se assim o que se poderá apelidar de díptico de parte da sua carreira, iniciado com La Danza de la Realidade, apresentado também em Cannes, há dois anos na Quinzena. Talvez seja essa uma forma deste exuberante realizador, poeta e psicólogo de 87 anos recuperar parte do fulgor da sua carreira cinematográfica, intermitente, desde os anos 70.
Como assumido registo de transmissão biográfica, algures entre o sonho e uma realidade banhada pelo surrealismo e o puro deleite pela arte lírica e a poesia, de que La Danza de la Realidad, lançado em 2013, fora a primeira parte, mais focada na infância de Alejandrito (Jeremias Herskovits), Poesia sem Fim retoma esse itinerário garrido e excitante, recuperando pelo caminho algumas das personagens centrais, para além de Jeremias, a soprano Pamela Flores, como a sua mãe, e Brontis Jodorowski, o filho de Alejandro, aqui no papel do seu pai, Jaime. De resto, um papel central, já que a relação traumática entre pai e filho ocupam e espevitam parte da ação e mesmo da sua explosão e entrega ao mundo para a arte, em geral, e da poesia, em particular. Central é também a presença de Adan Jodorowski, irmão de Brontis, a assumir a versão jovem de Alejandro.
Poesia sem Fim funciona como um desfile carnavalesco, de descobertas, assaltado por diabretes, homens esqueleto, personagens garridas, obsessivas, surrealistas como a poesia de Alejandro. Desde a sua cidade natal, em Tocopilla, até Santiago, onde decide ser pintor e se intromete no bas fonds, cruzando-se aqui com algumas das personagens que mais o influenciaram, como os poetas Nicanor Parra (Felipe Rios) e Enrique Lihn (Leandro Taub), a musa Stella (também interpretada por Pamela Flores) ou até a anã Pequenita (Julia Avadaño). Assim Jodorowski desfila a história da sua família, em que ele é o mestre cerimónias, mas também o centro das atenções.
Na sua ousadia deliberada em ser excessivo e chocante, Jodorowski permite-nos reviver o poder a arte e da poesia nos seus quadros impregnados por uma fantasia surrealista. Talvez um filme demasiado calórico para um público à procura de outras sensações, mas inevitavelmente coerente com todo o trabalho de Alejandrito. Nesse sentido, o conjunto destes dois filmes estará mesmo no melhor de Jodorowski.
Paulo Portugal, c7nema.net/  

 

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