3 SEGREDOS NÃO MUITO SECRETOS - IPJ, 21h30, às 2ªf.

Sócios 2€ *, estudantes 3,5€, restantes 4€*
*decisão da Assembleia Geral Extraordinária de 13 de Setembro


Dia 4
O SEGREDO DOS SEUS OLHOS

Juan José Campanella

Argentina/Espanha, 2009, 127’, M/16

O vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro é uma pequena surpresa – mesmo se assumirmos que o Oscar foi roubado a "Um Profeta" ou a "O Laço Branco". Primeiro, pela elegância e pela inteligência com que abrange e entrelaça géneros muito diferentes (o melodrama romântico, o filme policial, o "thriller" político) num todo plenamente satisfatório. Segundo (e principalmente), pelo facto de este ser um filme exemplar de um tipo de cinema "mainstream" inteligente, adulto, sóbrio, que Hollywood produzia em tempos desembaraçadamente mas que hoje abandonou por completo. Este podia perfeitamente ser um dos "thrillers" liberais dos anos 70, dirigidos por gente como Alan J. Pakula ou Sydney Pollack - e, nem por acaso, o filme passa-se de facto nos anos 70, na transição da Argentina liberal para a época peronista da repressão política e dos "desaparecidos", só que vistos a 30 anos de distância, pelos olhos de um antigo investigador judicial que recorda o crime que mudou a sua carreira e decide escrever um romance nele inspirado.
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Jorge Mourinha, Público




Dia 11
SHIRIN
Abbas Kiarostami

Irão, 2008, 92’, M/12

No Irão deve-se baixar os olhos perante uma mulher. Em SHIRIN, Abbas Kiarostami põe-nos a olhar, durante hora e meia, para 114.

Em SHIRIN está o império do feminino – e um império dos sentidos. Durante cerca de hora e meia, os rostos – o olhar – de 114 mulheres, actrizes iranianas de várias gerações (uma europeia entre elas, Juliette Binoche), que observam o que se passará num palco: a representação de um poema persa do século XII, “A História de Khosrow e Shirin”, sobre os amores de uma princesa arménia pelo rei da Pérsia e sobre o triângulo de paixões que se forma quando Shirin conhece Farhad.

Elas (e este será um retrato de senhora multiplicado por 114) reagem, choram, riem – o que vêem está fora de campo para nós. E Kiarostami, voyeurista assumido, já que gosta de olhar para quem está a ver, observa-as. Nós estamos com ele. E imaginamos o que elas podem estar a imaginar. Ou seja, estamos numa caixa de ressonância onde a fantasia e a nossa memória de espectadores (e somos espectadores daquelas espectadoras…) estão a ser constantemente alimentadas, excitadas.

E sempre dentro e fora, mergulhados na emoção, subjugados perante 114 mulheres.
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Vasco Câmara, Público


Dia 18
EU SOU O AMOR

Luca Guadagnino

Itália, 2009, 120’, M/12

Tilda Swinton é sublime num filme gloriosamente operático que reinventa o melodrama clássico e a saga familiar para um tempo em que eles já não existem. Atente-se na "chave" que dá título a este grandíssimo filme: Maria Callas, ela própria, interpretando a ária da "Mamma Morta" de Giordano, na banda-sonora do "Filadélfia" de Jonathan Demme, que Tilda Swinton vê uma noite na cama à beira de adormecer, antes de o marido chegar e mudar de canal sem sequer lhe perguntar o que está a ver. A frase que Callas canta é "Io sono l'amore" - "eu sou o amor" - e é nesse momento em que o marido a ignora como mera presença utilitária que a divina, gloriosa Tilda toma perfeita consciência do seu papel na poderosa família milanesa. Ela é a verdadeira "mamma morta" (aliás, mais tarde, alguém lhe dirá "tu não existes"), até o amor lhe cair do céu, numa noite de Inverno, na pessoa de um visitante inesperado que nem sequer fica para tomar café.

É complicado explicar o que se passa em "Eu Sou o Amor" sem correr o risco de menorizar a terceira ficção de Luca Guadagnino, porque o que eleva o filme ao estatuto de obra-prima é a abordagem operática, virtuosa, formalista, estilizada, hiper-romântica e pós-modernista com que o cineasta siciliano encara o melodrama clássico e a saga familiar, o modo como ele instala no classicismo do género um corpo estranho através de Tilda Swinton. “Eu Sou o Amor” é uma obra-prima.
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Jorge Mourinha, Público




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